domingo, 25 de maio de 2008

É extenso, mas vale a pena LER!!!!

Mudanças profundas e urgentes na educação

José Manuel Moran

Especialista em projetos inovadores na educação presencial e a distância

jmmoran@usp.br

A educação escolar precisa de uma forte sacudida, de arejamento, de um choque. A educação de milhões de pessoas, em todos os níveis, não pode ser mantida na prisão, na asfixia e na monotonia em que se encontra. Está muito engessada, previsível, cansativa. As crianças desenvolvem mais rapidamente sua inteligência e capacidade de aprender. A escola não consegue dar respostas minimamente satisfatórias aos reais alunos que temos. Obrigamo-los a se “moldarem” a esquemas pré-concebidos e repetidos à exaustão.

A Internet, as redes, o celular, a multimídia estão revolucionando nossa vida no cotidiano. Cada vez resolvemos mais problemas de múltiplas formas, presencial e virtualmente. Na educação, porém, continuamos indo ao mesmo local, no mesmo horário, para desenvolver as mesmas atividades. Sempre achamos justificativas para deixar tudo como está ou para fazer pequenas mudanças cosméticas e periféricas.

As tecnologias são apoio, meios. Mas elas nos permitem realizar atividades de aprendizagem de formas muito diferentes às convencionais. Podemos aprender estando juntos fisicamente e também longe, conectados. Podemos aprender sozinhos e em grupos, podemos aprender no mesmo tempo e ritmo ou em tempos e ritmos diferentes.

O conviver virtual vai tornar-se quase tão importante como o conviver presencial. Isso se consegue com uma gestão administrativa e pedagógica mais flexível, com tempos e espaços menos predeterminados, com modos de acesso a pesquisa e de desenvolvimento de atividades mais dinâmicas.

Com tantos aparelhos portáteis interconectados, sem fio e audiovisuais, o modelo de organização de alunos em espaços e tempos de calendários fixos está fadado a desaparecer. Teremos alunos começando um curso quando o desejarem. Seguirão algumas diretrizes básicas, bem amplas e flexíveis para organizar a sua trajetória de aprendizagem. O importante não é o número de aulas, mas os projetos desenvolvidos, a capacidade de resolver problemas, de fazer conexões, de estabelecer novas práticas. Os cursos estarão cada vez mais ligados a situações práticas interdisciplinares, que exigem professores orientadores grupais.

Podemos pensar em cursos cada vez mais personalizados, mais adaptados à cada aluno ou grupos de alunos. Cursos com materiais audiovisuais e atividades bem planejados e produzidos e que depois são oferecidos ao ritmo de cada aluno, sob a supervisão de um professor orientador ou de uma pequena equipe, que colocam esse aluno em contato com grupos em estágios semelhantes. Os professores podem agir como hoje fazem os orientadores de pós-graduação. Dão poucas aulas presenciais e virtuais. Acompanham o projeto pedagógico individual dos alunos e também em grupo e os supervisionam e gerenciam para que obtenham os melhores resultados. Os professores mapeiam a pesquisa, os projetos. Marcam algumas reuniões presenciais e virtuais. Integram esses projetos com outros colegas. O currículo é muito mais livre, escolhido de comum acordo entre aluno, professores e instituição. Há alguns momentos comuns presenciais e/ou virtuais (totalmente audiovisuais e interativos), mas a maior parte do tempo o processo é virtual e em tempos diferenciados.

O caminho é o da progressiva flexibilização, caminhando do presencial, para maiores níveis e graus de semi-presencialidade e de personalização do currículo.

As competências básicas serão cada vez mais as de saber escolher, avaliar as informações importantes para cada etapa da aprendizagem, as de relacionar tudo, de pôr em prática o compreendido teoricamente e de organizar sínteses a partir de práticas individuais e grupais. Outras competências necessárias são as de saber conviver presencial e virtualmente, de saber interagir afetiva e eticamente com colegas nas mais diferentes situações. A aprendizagem terá um componente muito mais lúdico, prático, de intervenção em situações próximas e distantes e envolverá à sociedade como um todo para ensinar e não só os profissionais da área. Toda a sociedade será educadora, um grande espaço de apoio e interação para aprender tanto pratica como teoricamente.

Na educação fundamental sempre haverá mais contato físico do que no ensino superior; a organização será mais previsível, sem ter um único currículo, um único caminho. Haverá diretrizes, algumas formas de avaliação periódicas para todos, mas o caminho para chegar lá será muito mais livre do que é hoje. A educação escolar será muito mais voltada para a prática, para a pesquisa, para projetos, para atividades integradas semi-presenciais.

As Faculdades de Pedagogia estão profundamente defasadas em relação às situações novas que estão aí e que exigem reformular tudo. Em pouco tempo seremos chamados de dinossauros por manter sempre, basicamente, o mesmo projeto de ensino para cada idade e para cada nível escolar. Precisamos preparar gestores e docentes abertos, orientadores e não meramente informadores e repetidores.

Todos os que estamos envolvidos com a educação precisamos conversar, planejar e executar ações pedagógicas inovadoras, com a devida cautela, aos poucos, mas firmes e sinalizando mudanças. Sempre haverá professores que não querem mudar, mas uma grande parte deles está esperando novas propostas sobre o que vale a pena fazer. Se não as experimentamos, como vamos a aprender?

Não basta tentar remendos com as atuais tecnologias. Temos quer fazer muitas coisas diferentemente. É hora de mudar de verdade e vale a pena fazê-lo logo, chamando os que estão dispostos, incentivando-os de todas as formas – entre elas a financeira – dando tempo para que as experiências se consolidem e avaliando com equilíbrio o que está dando certo. Precisamos trocar experiências, propostas, resultados.

Precisamos experimentar urgentemente novas formas de organizar processos de aprendizagem, de fazer experiências observadas, avaliadas, podendo errar, mas buscando acertar. O Ministério de Educação precisa autorizar grupos e instituições a poder fazer estas novas experiências supervisionadas. Sem elas será muito difícil quebrar a rotina, os modelos espaço-temporais há séculos consolidados e quem perde somos todos nós e a sociedade como um todo.

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